Última atualização: 01/08/2025 às 15:06:00
Decisão aplica Temas 6 e 1234 da Repercussão Geral e analisa pareceres técnicos para cada doença alegada
A Turma Recursal da Justiça Federal na Paraíba (JFPB) manteve, por unanimidade, a negativa ao fornecimento de medicamento à base de canabidiol (CBD), pleiteado por uma pessoa com múltiplos diagnósticos psiquiátricos e neurológicos. O colegiado concluiu que não foram atendidos os requisitos legais e científicos exigidos para a concessão judicial do fármaco, conforme a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O julgamento seguiu os critérios definidos nos Temas de Repercussão Geral 6, 1161 e 1234, além das Súmulas Vinculantes 60 e 61. De acordo com o STF, a concessão de medicamentos autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas não incorporados às listas do Sistema Único de Saúde (SUS), exige o cumprimento de condições específicas, entre elas a demonstração da eficácia e da segurança do fármaco com base em evidências científicas de alto nível.
Pelo Tema 6, a concessão judicial de medicamentos não incorporados ao SUS exige, entre outros critérios, parecer técnico favorável do NATJUS (Banco Nacional de Pareceres – Sistema e-NatJus), sendo insuficiente a simples prescrição médica individual.
Já o Tema 1234 reforça que a análise de medicamentos na esfera judicial deve respeitar os acordos interfederativos homologados pelo STF, priorizando a governança colaborativa entre União, estados e municípios. A atuação do Judiciário, nesse contexto, limita-se à verificação da legalidade do ato administrativo que negou o fornecimento, sem interferência no mérito das políticas públicas de saúde.
No caso concreto, a parte autora solicitava o uso contínuo do canabidiol para tratar esquizofrenia paranoide, autismo infantil, transtorno depressivo recorrente, epilepsia e transtornos mentais relacionados ao uso de álcool. Entretanto, pareceres técnicos da plataforma e-NatJus – serviço do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que subsidia decisões judiciais na área da saúde – indicaram ausência de comprovação científica robusta quanto à eficácia e à segurança do medicamento para essas condições.
Entre as conclusões destacadas:
- Epilepsia refratária: o CBD pode reduzir crises convulsivas, mas os estudos disponíveis apresentam baixa a moderada certeza e apontam aumento de eventos graves e adversos. Há incertezas quanto à eficácia na melhoria da gravidade das convulsões, da função cognitiva e da saúde mental.
- Autismo (TEA): a evidência disponível é de baixa certeza. O extrato integral da planta pode apresentar algum benefício, mas os efeitos do extrato purificado são incertos. Há falhas metodológicas nos estudos e ausência de comparações com medicamentos já disponíveis no SUS, como a risperidona.
- Esquizofrenia: a prescrição do CBD ainda é considerada experimental. Os estudos existentes são escassos, com baixa qualidade metodológica, e não demonstram superioridade do canabidiol frente a outras opções terapêuticas já incorporadas ao SUS.
- Transtorno depressivo: também não há evidências suficientes que sustentem a eficácia do canabidiol nesse quadro clínico. O relatório do e-NatJus aponta que não foram exploradas adequadamente as alternativas disponíveis no SUS, tampouco foram comprovadas contraindicações específicas.
- Transtornos relacionados ao uso de álcool: até a data do julgamento, não existiam pareceres ou notas técnicas disponíveis no e-NatJus sobre a efetividade do CBD para esse tipo de patologia.
Para o relator, juiz federal Bianor Arruda Bezerra Neto, não houve comprovação de que o medicamento atende às exigências estabelecidas pelo STF: “Não foram preenchidos os requisitos previstos nos Temas 6 e 1234, nem houve comprovação da eficácia e segurança do medicamento com base em evidências científicas de alto nível”, pontuou.
A decisão, que reforça a necessidade de rigor técnico nas demandas judiciais de saúde, consolida o entendimento da Turma Recursal sobre o fornecimento de canabidiol, tema recorrente na Justiça Federal. “É preciso cautela e base científica sólida, sobretudo em casos que envolvem patologias complexas e medicamentos ainda carentes de validação científica robusta”, concluiu o magistrado.